Passava de meia noite, mas o relógio contava ainda os primeiros minutos da quarta-feira (15), quando José Cardoso Sobrinho, de 56 anos, foi avisado de que os quatro ônibus de turismo que possuía tinham sido queimados. Os veículos estavam em uma garagem no conjunto Vale Dourado, na zona Norte de Natal e foram alvo de ataques criminosos que se arrastam desde a madrugada de terça-feira (14). “Senti uma tristeza tão grande, porque foram 20 anos de batalha que se acabaram em cinco minutos”, relata o empresário, em tom de desabafo. O prejuízo total, segundo ele, é de R$ 500 mil.Outros veículos que estavam guardados no local, não foram atingidos. Com a perda, seu Cardoso diz ser difícil saber exatamente o que fazer agora, mas está ciente de que é necessário seguir em frente. “É preciso manter os pés no chão, erguer a cabeça e ver o que fazer. Deus vai mostrar uma maneira de resolver isso”, afirma. Ele relata que, para este final de semana, estava programada uma excursão para o Município de Pureza e que será repassada para outra empresa.
Sem grandes perspectivas de resolução imediata dos prejuízos, seu Cardoso espera agora contar com a solidariedade de terceiros. “Os amigos estão fazendo uma campanha para ver se eu consigo comprar pelo menos um novo ônibus para tentar recomeçar. Tem que recomeçar”, pontua. As doações podem ser feitas via pix (chave: 015 899 904 55), em nome de Thayane Costa Cardoso, filha dele. Em Mossoró, na região Oeste, mais registros de perdas, angústias e medo.
Outra vítima da falta de segurança foi Marcos César Medeiros, de 53 anos. Ele esperava para carregar o caminhão, veículo que ele utilizava para descartar lixo, quando um homem armado se aproximou e ordenou que ele corresse. Marcos contou à TRIBUNA DO NORTE que testemunhas disseram ter notado a participação de quatro homens na ação. Um deles, segundo o relato, foi até a boleia do caminhão, jogou gasolina e incendiou o veículo. “A cabine, o motor, a caixa de marcha... tudo foi queimado”, afirma Marcos.
Ele relatou ainda que conseguiu um extintor em um posto de gasolina próximo, mas quando retornou, o fogo já havia tomado todo o veículo. “Tenho olhado muito para o caminhão, sem saber o que fazer. Ele foi comprado em 2021 e eu ainda devo R$ 10 mil. Marcos César diz que um veículo do tipo custa, em média, R$ 230 mil. O homem presta serviços para uma empresa e, com a perda do caminhão, viu desaparecer a única fonte de renda que possuía.
“Quando eu vi o carro pegando fogo, senti tanta tristeza. Lutei muito para comprá-lo e em um minuto, vem alguém e coloca fogo em tudo”, lamenta. “Graças a Deus as pessoas estão me ajudando e eu estou com esperança que vou conseguir um bom dinheiro”, afirma Marcos César em seguida. Para ajudá-lo, o filho criou uma campanha para doações via pix (chave: 84 9 9818-3845, em nome de Marcos César da Silva Medeiros).
Também foi criada uma vaquinha virtual para doações (podem ser feitas em https://www.vakinha.com.br/3579268).
Ataques afetam serviços públicos
No interior do Estado, os ataques afetaram veículos e alteraram – em alguns casos, suspenderam - serviços públicos. É o caso de São Tomé, no Agreste potiguar. Na madrugada desta quarta-feira, dois micro-ônibus, um trator e um ônibus foram incendiados. As aulas estão suspensas e o expediente das Unidades Básicas de Saúde foi reduzido, com funcionamento apenas pela manhã. O prefeito da cidade, Anteomar Pereira, conhecido como Babá, disse que a paralisação das aulas, que segue até a próxima sexta-feira (17), afeta 2,4 mil alunos.
Dos veículos atingidos, segundo Babá, um ônibus e um micro-ônibus tiveram perda total. Eles eram utilizados para transportar estudantes. “Os dois juntos são responsáveis por levar cerca de 60 alunos para a aula. A Secretaria de Educação está analisando se unifica duas linhas ou se contrata dois veículos terceirizados”, afirma o prefeito. Ainda de acordo com ele, um segundo micro-ônibus teve perdas parciais. “Um pneu foi estourado e o veículo teve parte da instalação elétrica queimada”, disse Babá. Nesse caso, a previsão é de que os reparos durem uma semana. O trator não teve grandes perdas.
Na terça-feira, conforme informou o prefeito de São Tomé, a cidade já tinha sofrido com os ataques criminosos. “Houve disparos contra a viatura da polícia e tentaram queimar um micro-ônibus, mas não conseguiram. Está um pânico muito grande por aqui”, pontua Babá. As ações não resultaram em feridos. Em Campo Redondo, também no interior do Estado, mais ataques.
Dr. Renam, prefeito do Município, disse à TRIBUNA DO NORTE que, na madrugada da terça-feira (14), por volta de 1h, criminosos atearam fogo em três ônibus escolares, uma ambulância, um caminhão-pipa e uma caçamba. O fogo se espalhou pelos veículos e atingiu uma parte da sede da Prefeitura. “Apenas um ônibus a gente conseguiu salvar. Os demais veículos tiveram perda total”, conta o prefeito.
Segundo ele, um dos ônibus havia sido comprado há cerca de dois meses. As perdas devem impactar significativamente os estudantes do Município, uma vez que, de acordo com o prefeito, a maioria depende do transporte para chegar à escola. “Quase metade dos 2 mil alunos de Campo Redondo está na zona Rural e boa parte depende dos ônibus para ir às aulas. Tem também uma parcela que vai para o IFRN de Santa Cruz e que também está prejudicada pela falta de ônibus”, descreve.
As aulas no Município, a exemplo de São Tomé, estão suspensas. “Paramos por 48 horas, na terça-feira e deveremos prorrogar a suspensão por mais 48 horas”, diz Dr. Renam. Além disso, a perda dos demais veículos traz impactos para o Município. “A caçamba estava fazendo a limpeza dos barreiros nas comunidades rurais. Já o carro-pipa é utilizado no programa do Exército e a Prefeitura encaminha carradas d'água para os distritos, para abastecer as cisternas. Aqui em Campo Redondo, cerca de 45% das pessoas vivem na zona Rural. Nós temos cerca de 10.500 habitantes, no total. Estamos buscando medidas emergenciais para tentar reverter os impactos o mais rápido possível e evitar tantos danos à população”, afirmou o prefeito.
Veículos na Grande Natal são atacados
Em Ceará-Mirim, na Região Metropolitana de Natal, Alcimar Cordeiro de Moura, de 47 anos, também tem uma história para contar sobre os ataques que têm aterrorizado os potiguares nos últimos dois dias. Na terça-feira, ele recolheu o micro-ônibus por volta das 17h, como faz todos os dias e tentou levar a um posto de gasolina, onde outros veículos do tipo passariam a noite exatamente em decorrência dos ataques.
Chegou-se à conclusão, segundo Alcimar, de que o local era mais seguro. Sem vagas no posto de gasolina, ele levou o veículo para casa. Por volta das 22h, quando Alcimar retornava de um compromisso na rua, deparou-se com o ataque. Ele conta que três homens, com o rosto coberto atearam fogo no veículo.
“Fiquei em estado de choque, sem saber o que fazer, mas me lembro que reagi e corri para tentar apagar o inêndio. Os vizinhos me ajudaram trazendo água. Em mais ou menos 20 minutos a gente conseguiu controlar o fogo. Segundo Alcimar, o veículo ficou parcialmente danificado e será possível recuperá-lo. O prejuízo estimado é de R$ 12 mil a R$ 15 mil. Ele revela que tem outro veículo e vai continuar trabalhando, apesar do receio de voltar às ruas. “Estou temeroso [de voltar para a rua], porque o Estado não atende a todas as situações. Tudo isso é muito desconfortável. Tenho outro carro e vou seguir trabalhando até consertar o micro-ônibus. Uma amiga e um sobrinho fizeram uma campanha para me ajudar a reverter o prejuízo”, detalha.
No caso dele, doações podem ser feitas via pix (84 9 9435-5850). Para além da recuperação das perdas financeiras, Alcimar relata que espera o fim da situação de uma vez por todas e melhores condições de segurança para os brasileiros. “A gente fica triste com tudo isso, porque é uma vida toda de trabalho. É daqui que eu tiro o sustento da minha família e peço a Deus que isso não aconteça com ninguém. Quero uma cidade e um país melhor, onde todos possam criar os filhos com tranquilidade”, diz o homem, em forma de apelo.